Sabe o que é uma merda?
Você está no seu mundo vivendo numa boa... Tem seus planos de carreira, de viajar o mundo todo... Toda uma vida e um futuro organizados. E você está feliz e satisfeita consigo mesma. As tempestades já passaram e disso aprendeu muito, descobriu e se tornou quem realmente é, bla bla bla...
Tá, aí, do nada, acontece uma invasão no seu território. O reino dos seus pensamentos sucumbe. Suas emoções entram em rebelião. Porque um intruso, do nada, sem mais nem menos, simplesmente resolveu visitar o seu mundo. E assim, nem pediu permissão, sabe?
Mas ok, ele não é mal educado, é um fofo, então, você até libera a entrada dele e deixa ele passear por aí.
Acontece que ele gostou muitos dos seus pontos turísticos que mais chama a atenção, entende e até coisas que ninguém perceb. E ele decide se hospedar por um tempo, digamos, indeterminado. E tá, como anfitriã, você dá uma de simpática e tal.
E aí... ele faz uma coisa, alguma coisa, que o diferencia da multidão sem face, banal e ridícula que atravessa fantasmagoricamente todas as suas ruas e alamedas. E você, distraída, meio lesada, começa a prestar mais atenção.
E o identifica, você finalmente vê quem ele é, quem ele é no seu mundo, porque ele pode ser um pedaço dele e até ajudar a reformar aquela praça ou alargar avenidas.
E vocês começam a construir pontes. Porém quando está quase no final da obra, ele abandona. É, bem no meio, faltando centímetros. E uma distância que não existia começa a crescer cada vez mais. E por mais que você se esforce, invista mais na qualidade do material da obra, a ponte vai desmoronando... e não vai alcançar pegar o nada que te cerca, vai cair, despensar na realidade. A Realidade que expulsou há séculos do seu reinado e verdades contaminadas que não existem no seu inverso começam devorar suas ideias, seus desejos, sonhos, planos. Começam a destruir tudo o que você imaginou, todas as suas crenças, príncipios.
E dores que te enfraquecem e cicatrizes que sangram, te mergulham de volta àqueles mumúrios do passado que a fizeram construir um mundo do pó, um mundo sem planta, sem planos, desorganizado, sem disciplina, sem futuro, vazio.
E se você construiu apenas com ferramentas das sua imaginação e reformou das cinzas uma vez, suas estruturas podem não ser totalmente inabaláveis, mas desaparecer, elas não vão.
E a merda começa nisso. Quantas vezes vamos permitir a entrada de estranhos estrangeiros em nosso mundo? Que o bagunçam e não ficam para ajudar a arrumar? Até quando vamos suportar viver reconstruindo-o?
Com o tempo ele vai se transformar numa gaiola, numa prisão, vamos construir muros e grades. Não vamos conseguir nem querer sair, não vamos conseguir entrar nem nos abrir para outros universos e colocar pontes definitivas... Nunca vamos sair do lugar e daí nosso mundo vai se desmanchar, desalinhar... E vai parecer que ele nunca existiu, porque nós nunca realmente habitamos a vida.